Meditações

Papai, por que calvinistas e arminianos brigam?

Por Maurício Zágari

A grande e problemática discórdia entre os irmãos em cristo.

Se você acompanha o APENAS há algum tempo sabe que já há alguns anos venho travando um esforço grande e me dedicado a tentar levar calvinistas e arminianos a compreender que suas diferenças não podem levá-los a tratar uns aos outros com agressividade, ofensas e chacota. Afinal, são irmãos, filhos do mesmo Deus, que discordam num aspecto secundário da fé. O texto que publico hoje escrevi há dois meses, após um episódio que vivi com minha filha, mas tinha desistido de publicar, pois a sensação que tinha é que todo o meu empenho – como a formiguinha que sou – estava sendo inútil. Eu continuava vendo uma surreal troca de farpas entre os dois grupos, o que começou a me desanimar. Foi quando, semana passada, li uma “Nota pública sobre o debate entre calvinistas e arminianos”, em que pastores, teólogos e líderes evangélicos de peso repudiam ataques pessoais em disputas religiosas (leia AQUI . O texto está dividido em três slides consecutivos). Fiquei felicíssimo, pois percebi que não sou uma voz que clama no deserto. Por isso, com meu ânimo revigorado, decidi publicar o que escrevi dois meses atrás, como forma de somar um tiquinho ao debate e, quem sabe, contribuir um pouco. Segue o texto:

Minha filha é uma criança muito atenta. Do alto de seus 4 aninhos, ela escuta bastante e guarda coisas que falamos quando achamos que ela está totalmente desligada da conversa. Pois bem: não é segredo para quem me acompanha que eu não tenho muito interesse em ficar discutindo calvinismo versus arminianismo e que tenho grande tristeza pela agressividade que permeia o debate entre os dois grupos. Batistas arminianos e presbiterianos calvinistas, por exemplo, são igualmente irmãos em Cristo e desqualificar qualquer indivíduo por sua crença soteriológica é na verdade desqualificar a obra da graça naquela vida.  É atacar o que Deus fez por ela e, portanto, é atacar Deus. Eu estava conversando ao telefone recentemente com um pastor amigo sobre essa questão e minha filha estava perto, desenhando. Assim que desliguei, a pequena curiosa virou-se para mim e começamos um diálogo que foi mais ou menos assim:

— Papai, o que é isso que você tava falando?

— O que, filha?

— Calnimo e minismo.

— Ah (risos), calvinismo e arminianismo?

— É. Que é isso, papai?

— Hmmm…. Ahnnn… bebê, são duas formas de ser amigo de Jesus.

— Qual é a diferença?

— Hmmm… Ahnnn… Olha… tem algumas diferenças, mas um dia eu te explico.

— Ah, papai, quero saber agora.

— Tá… Olha… Calvinistas são amigos de Jesus que acreditam, entre outras coisas, que foi Jesus quem quis ser amigo deles e arminianos acreditam que eles ficaram pensando um pouquinho antes de decidir se atenderiam ao convite de Jesus para serem seus amigos.

— Então os dois são amigos de Jesus?

— Isso.

— Ué, então qual é a diferença?

— Ah, filha, esse assunto já gerou tanta briga boba, vamos falar de outra coisa? Quer ler um livro?

— Não, papaaaaai! Me explica!

— Ai… Tá bem. Olha só, é o seguinte, os calvinistas acham que eles são maus pra caramba. Que Jesus é quem os escolheu pra serem amigos. Que Jesus  morreu na cruz só por eles. Que quando Jesus quer ser amigo de alguém essa pessoa não pode recusar a amizade dele. E que nunca mais essa pessoa vai deixar de ser amiga de Jesus.

— Ah, tá. Mas e os outros?

— Os arminianos?

— É.

— Olha, eles também acham que é Jesus quem chama quem quer ser amigo, mas nem todo mundo quer a amizade dele. Que ele morreu na cruz pra ser amigo de todo mundo que quiser ser. Que o Espírito Santo é quem faz o convite de Jesus. E que as pessoas que hoje são amigas de Jesus amanhã podem não ser mais.

— Ah, tá. (Silêncio). Eu sou o quê?

— Ahn… éééé… Mmmmm… filha, você é amiga de Jesus, não é?

— Sou, papai.

— Isso é que é importante.

— Não entendi, papai.

— Ah, filha, isso é complicado, deixa pra lá.

— Não, papaaaai, explica!

— Tá bem, tá bem. (Silêncio). Filha, arminianos e calvinistas são amigos de Jesus. É como a Bebel e a Gabi, da sua escola. A Bebel é morena e a Gabi é loira, elas são irmãs, filhas do mesmo papai, e as duas são suas amigas, não é?

— É.

— Faz diferença pra você uma ser loira e a outra ser morena ou o importante é elas serem irmãs que se amam e serem suas amigas?

— Serem irmãs que se amam e minhas amigas, ué! Claro, né!

— É claro, sim, mas pra muita gente não é. Nesse assunto, é mais ou menos a mesma coisa: calvinistas e arminianos são amigos de Jesus, vão morar no céu, querem que outras pessoas também se tornem amigas de Jesus, se esforçam pra sempre obedecer Jesus e são irmãos. Naquilo que realmente importa, são iguaizinhos.

— E eles brigam, papai? Porque eu já vi a Bebel e a Gabi brigarem.

— Infelizmente, alguns deles brigam sim, bebê. Não todos, mas alguns. Muitas vezes eles brigam porque acham que ser loiro ou moreno é a coisa mais importante que tem. E ficam um tempão falando sobre como é importante ser loiro ou  ser moreno em vez de se dedicar a falar sobre coisas mais importantes. E pior: ficam debochando ou atacando o outro apenas porque não é loiro como ele ou não é moreno como ele. Só que o mais importante é que eles são irmãos e amam Jesus, né?

— (Silêncio, pensando). É, papai. (Silêncio). Mas, papai, depois que a Bebel e a Gabi brigam elas se abraçam e ficam de bem.

— Isso! Isso é que é importante, bebê. Porque ficar de bem com os irmãos é muito mais importante que ficar brigando porque um é loiro e o outro, moreno, você não acha?

— Ué, claro, né! (Silêncio, pensando) Mas eu ainda não entendi por que eles brigam. Eles puxam o cabelo um do outro e mordem?

— Podemos dizer que sim, bebê.

— Que feio, né, papai?

— Muito feio.

— Eu mordia quando tinha dois anos mas não mordo mais.

— Porque você cresceu e aprendeu que Jesus não gosta disso, né?

— É. (Silêncio) Papai, você sempre me disse que os amigos de Jesus não batem nos amigos, então como é que os calnistas e os minianos ficam se batendo?

— Pois é, bebê, eu também não entendo isso.

Depois de um tempo em silêncio, pensando, minha filha continuou:

— Papai, você é o quê? Calmista ou miniano?

— Eu sou amigo de Jesus, bebê.

— Tá, mas você é amigo de Jesus calmista ou amigo de Jesus mininano?

— Eu sou ______, filha.

— E a mamãe?

— Mamãe também. Mas ela não dá muita atenção a isso, bebê.

— E o vovô e a vovó?

— Sim, o vovô é pastor da igreja ______, então eu sei que ele é ______, igual ao papai.

— E o pai da minha amiga Helena? Ele também é pastor!

— Ele é, diferente, filha, é  ______, porque é pastor de outra igreja, a ______.

— (Cara de assustada) Mas o vovô e o pai da Helena brigam, papai?

— Não, filha, não brigam. Os dois são amigos de Jesus e, logo, são amigos um do outro.

— Ué, mas se um é calmista e o outro é mininano como é que eles não brigam?

— É porque eles sabem que o que eles têm em comum é mais importante do que o que têm de diferente. E os dois são amigos de Jesus, os dois sabem que ir pro céu depende de Jesus convidar, os dois sabem que precisam obedecer a Jesus até o dia em que forem morar no céu. E os dois sabem que o amor que une eles é mais importante que qualquer outra coisa.

— Que bom, papai, porque se eles brigassem eu não ia poder chamar um deles pro meu aniversário, né?

— (Muitos risos) É verdade, seria muito feio ver os dois brigando na frente dos outros. Não seria nada cristão. Mas pode convidar, sim. O vovô e o papai da Helena são maduros e sabem que não vale a pena ficar brigando por causa desse assunto. Eles vão conversar sobre coisas mais importantes na sua festa e vai ficar tudo bem, tá?

Nesse ponto, minha filha abriu um largo sorriso.

— Que bom, papai, porque eu quero que no meu aniversário vão todos os meus amigos!

— Fica tranquila, bebê, eles vão sim.

— Jesus também quer que todos os amigos dele vão no aniversário dele, né?

— (Risos) Claro, filha! Jesus ama todos os amigos dele, não importa se são loiros ou morenos.

— Que bom, papai. Jesus é esperto.

— É sim, filha. Quer ler um livro agora?

— Quero!

Nesse ponto fomos até a biblioteca da minha filha, escolhemos um livro e deitamos na cama para ler. Enquanto eu punha os óculos, ela virou-se para mim.

— Papai, se os calmistas e os minianos são amigos de Jesus, por que eles brigam?

— De novo isso, bebê?!

— É que eu ainda não consegui entender por que eles brigam.

— Quer saber, filha? Nem eu. Nem eu…

.

Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício Zágari

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